Duas pessoas que se amaram

Gente, eu me identifiquei muito com esse texto, por razões óbvias. Há alguns anos, os ex-amantes tinham que virar inimigos, senão todo mundo olhava feio e achava estranho. Que bom que o mundo mudou!
Leia este texto, da Fabíola Simões, do seu livro: A soma de todos os afetos. Já coloquei na minha lista de livros para ler. Sem dúvidas…
Espero que você também goste e possa, um dia, passar por essa experiência tão maravilhosa!

“Existe um período de tempo que os ex amantes necessitam para se recuperar de uma separação. Esse período pode durar dias, meses ou anos. Porém, chega uma hora em que as mágoas são dissipadas, as lembranças dolorosas não machucam mais, e o carinho pelo tempo de convivência aflora.
Cedo ou tarde esse momento chega para todos que um dia se amaram. Porém, nem todos conseguem romper a barreira do estranhamento e se reaproximar de um jeito novo.
Existe um ciclo afetivo que determina um prazo até que estejamos prontos para nos relacionar novamente com aqueles que um dia amamos. Esse ciclo estabelece um período de tempo em que temos que nos curar e sermos capazes de direcionar nosso afeto, nosso carinho e nossas boas lembranças para um novo tipo de relação: a amizade.
Foi Domingos de Oliveira que disse: “Aqueles que se amaram muito um dia têm que permanecer amigos para sempre, senão o mundo fica cruel demais“. Pois eu penso da mesma forma. Não há crueldade maior que nunca mais trocar algumas palavras com aqueles que um dia amamos. Não há insensatez maior do que acreditar que não é possível olhar para trás com ternura e afeição, sem um pingo de má intenção. Não há incoerência maior que imaginar que o amor não possa se transformar numa amizade real e desprovida de recaídas.
Por alguma razão seguimos em frente por caminhos distintos, mas isso não significa que colocamos uma pedra em cima do que fomos ou do que vivemos. Carregamos em nós retalhos de nossas vivências e vestígios de nossas experiências afetivas.
Como filha de pais separados que estiveram juntos por quarenta anos, me alegra perceber que o hiato de mágoas, desconforto, tristeza e ressentimento entre eles chegou ao fim. Devagar conseguem se apoiar nos momentos difíceis, posar para fotos juntos nos aniversários dos netos e compartilhar a alegria dos bons momentos.
Mais que um gesto de civilidade, eles permanecem se amando de um jeito novo, com muito menos dor. Crueldade seria permitir que o tempo passasse sem voltarem a se cumprimentar. Crueldade seria autorizar o avanço da vida sem nunca mais sentarem à mesma mesa para tomarem um chá.
Aqueles que um dia se amaram muito jamais poderão agir como meros desconhecidos. Depois que a poeira baixa e as feridas cicatrizam, ainda resta a possibilidade da amizade. Não como um prêmio de consolação, e sim com a certeza de que é possível usufruir desse vínculo de uma outra maneira, muitas vezes bem melhor.
Por mais doloroso que tenha sido o fim, um dia deixará de doer. E sentiremos falta da pessoa _ não como objeto da nossa paixão _ e sim como alguém que queríamos sempre por perto. Tornar possível a amizade com quem um dia amamos é um gesto de amor próprio.
Porém, é importante ressaltar que não devemos romantizar essa amizade, e sim entender que ao possibilitarmos esse elo, estamos aumentando nosso repertório de relações humanas, amadurecendo nossa afetividade, nos tornando melhores e mais sensíveis. Não há perdas, só ganhos.
Sendo assim, só posso concluir que a tristeza pelo fim de uma relação amorosa pode ser amenizada pela esperança de um dia nos tornarmos amigos. Pela possibilidade de um dia voltarmos a nos encontrar de uma forma mais suave, sem o medo de ser abandonado, sem a insegurança da paixão, sem as cobranças e exigências de uma relação. Talvez isso amenize a dor do fim. Talvez isso possa ser o combustível para termos paciência com o tempo e as demoras. Talvez isso nos permita ver a vida como um ciclo de finais e recomeços…”

 

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